Direito Natural: de Antígona de Sófocles ao Tempo Atual

12 de agosto de 2022

Paulo Eduardo Razuk

Desembargador aposentado do TJSP                                                                                     

Bacharel  e Doutor em Direito pela USP

 

Antígona é uma tragédia grega escrita por Sófocles (496/406 a.C.), que, ao lado de Ésquilo e Eurípedes, compõe o triunvirato do teatro grego, que conserva grande atualidade, pelos temas de alta relevância para a alma humana que abordam.

Na obra de Sófocles, destaca-se a chamada trilogia tebana, composta pelas peças Édipo Rei, Édipo em Colono e Antígona. Na primeira, o personagem mata o pai, Laio, rei de Tebas, e se casa com a mãe, Jocasta. A segunda descreve o exílio do personagem em Colono. Na terceira, sobressaem vários aspectos relevantes da sociedade grega à época.

Édipo tivera com Jocasta quatro filhos: Polinice, Etéocles, Ismênia e Antígona. Em meio a uma guerra civil, na disputa pela coroa de Tebas, os filhos varões acabam por matar-se um ao outro. Sobe ao trono Creonte, irmão de Jocasta, que decide pelo sepultamento de Etéocles conforme o cerimonial devido aos mortos; Polinice seria largado aos cães e aves de rapina.

Antígona opõe-se ao tirano, deixando claro que não abandonará o corpo do irmão sem o devido rito sagrado:

“Sim, porque não foi Zeus que o promulgou; e a Justiça, a deusa que habita com as divindades subterrâneas, jamais estabeleceu tal decreto entre os humanos; nem eu creio que teu édito tenha força bastante para conferir a um mortal o poder de infringir as leis divinas, que nunca foram escritas, mas são irrevogáveis, não existem a partir de ontem, ou de hoje; são eternas, sim! E ninguém sabe desde quando vigoram! Tais decretos, eu, que não tenho o poder de homem algum, posso violar sem que por isso me venham a punir os deuses!“.

A manifestação de Antígona diz respeito ao direito natural, abordado por Sócrates (470/399 a.C.), que reconhece, acima das leis mutáveis e escritas, a existência de uma lei natural, independente do arbítrio humano, universal, fonte primordial de todo o direito positivo, expressão da vontade divina promulgada pela voz interna da consciência. A lei natural supõe um ser superior ao homem, um legislador que a promulgou e sancionou. Então, o direito de sepultar os mortos conforme a tradição é invocado como direito natural, que não poderia ser afastado por norma de direito positivo, no caso o decreto do tirano.

Ainda, ela refere-se a sua condição de mulher, sem poder de homem algum. Na Grécia antiga, no período clássico, a mulher era relegada a uma posição inferior, devendo permanecer reclusa em casa. Não era considerada igual pelo marido, nem encorajada a aparecer em público ou a ter qualquer participação na atividade social ou intelectual.

O papel subalterno da mulher era determinado pela religião doméstica, conforme a qual se prestava culto aos deuses lares, o que determinava o parentesco religioso ou agnatio, sendo parentes os que prestavam culto aos mesmos deuses. Desde o nascer, a mulher professava o culto de seu pai, do qual era desligada ao casar-se. Da casa do pai partia uma procissão, que seguia até a casa do noivo, onde por ele seria iniciada no culto doméstico marital. Não podia adentrar a soleira com os próprios pés, tendo de ser carregada nos braços pelo noivo até o altar doméstico, onde se dava a cerimônia religiosa, na qual compartilhavam o panis farreus, daí o nome de confarreatio, dado ao casamento em latim. A cognatio ou parentesco consanguíneo era irrelevante. Daí que o casamento significava para a mulher uma mudança de culto. Da religião antiga remanescem o cortejo nupcial, durante o qual é jogado arroz sobre os noivos para desejar-lhes fertilidade, e o bolo nupcial.

Na população havia três grupos distintos: os cidadãos, os metecos e os libertos e escravos. A cidadania era reservada aos eupátridas, que constituíam a aristocracia agrária e exerciam o poder político. Os metecos eram os estrangeiros livres, que exerciam o comércio, mas não podiam possuir terras, nem detinham poder político. Os libertos eram os escravos que tinham conseguido a sua alforria, podendo exercer as suas profissões. Os escravos eram considerados bens patrimoniais, sendo destituídos de qualquer direito.

Enfim, a mulher de qualquer classe social tinha uma posição inferior na Grécia antiga, cujo modelo social, político e econômico é considerado o berço da democracia moderna. Posto que pertencente à nobreza, Antígona pagou com a vida haver se oposto ao decreto do tirano.

 

BIBLIOGRAFIA

Pe. Leonel Franca – Noções de História da Filosofia, 19ª edição, Livraria Agir, Rio de Janeiro, 1967.

Teatro Grego, tradução de J. B. de Mello e Souza, Jackson Editores, Rio de Janeiro, 1950.

Indro Montanelli, História dos Gregos, Ibrasa, São Paulo, 1968.

Fustel de Coulanges, A Cidade Antiga, Edameris, São Paulo, 1967.

Edward McNall Burns, História da Civilização Ocidental, 2ª edição, Editora Globo, Porto Alegre, 1965.

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