Clube de Leitura discute obras de Annie Ernaux

15 de março de 2023

O Clube de Leitura discutiu, no último dia 7/3, os livros “O lugar” e “A vergonha”, da escritora Annie Ernaux. O evento teve a participação da escritora e professora Elizabeth Cardoso e mediação da magistrada Adriana Alberguet Albano. Ernaux foi laureada com o Nobel de Literatura, de 2022, “pela coragem e acuidade clínica com que descortina as raízes, os estranhamentos e os constrangimentos coletivos da memória pessoal”, tornando-se na primeira mulher francesa a ser laureada com o prêmio”.

“O lugar” lançou Ernaux à fama internacional. Nele, a escritora se debruça sobre a vida do próprio pai para esmiuçar relações familiares e de classe, numa mistura entre história pessoal e Sociologia que décadas mais tarde serviria de inspiração declarada a expoentes de autoficção mundial e grandes nomes da literatura francesa.  A obra tem seu início de maneira direta e marcante: “Meu pai tentou matar minha mãe num domingo de junho, no começo da tarde”. Nesta obra, Ernaux aborda o sentimento gravado em seu espírito por tal fato e que passa a acompanhá-la ao longo dos anos.

A partir de “O lugar”, a escritora francesa se afasta da ficção mais convencional e passa a narrar a própria vida, abandonando o gênero romance e se instalando em uma fronteira que propositalmente confunde o biográfico e o ficcional. “Com a época das selfies, dessa egotrip geral, Ernaux consegue trazer uma obra com tantas encruzilhadas pessoais sem ser uma obra centrada. O modo como ela faz autoficção se eleva a uma categoria de autosócio-ficção. Ela mistura a biografia pessoal com a biografia da França. Cada palavra da escritora parece um golpe. É muito dura, seca, utiliza frases curtas e substantivadas. Economiza nos adjetivos, mas quando eles veem, o leitor prende a respiração”, afirma Cardoso.

Real e ficcional: limites borrados

Neste sentido, a professora concentra sua análise em “O lugar”, primeiro romance da escritora, lançado em 1983. Nele, o público encontra tudo que se aplica aos projetos poéticos dos grandes autores. E, mais do que nunca, em literatura não é o que se conta, mas como se conta.  “Estamos diante de memórias de relações familiares, atravessadas pelas questões de classe social. [ ] Neste livro, a escritora produz ainda limites borrados entre o real e o ficcional; ambiguidade constante entre ficção e acontecimento e biografia e um pacto ficcional muito grande com o leitor”, frisa a professora.

Além de todas as características discutidas pela professora, Cardoso aponta ainda como grande marca do projeto literário de Ernaux a metaficção, o vai tornar a autoficção um gênero tão cobiçado pelos autores. “O mais interessante é como ela [Ernaux} usa a metaficção dentro da autoficção. Metaficção, como os momentos em que ela faz literatura falando de literatura. Aqui, estamos diante do Nobel, é aqui que o prêmio vale”, afirma a professora.

Cardoso não deixa de apontar o fantástico efeito que a escritora obtém por meio da descrição de fotografias na obra, que acaba levando o leitor à sensação de estar percorrendo um álbum de família. “Ela usa a fotografia como um arcabouço de memórias. No romance ‘A vergonha’, essa presença é ainda mais forte.  Ernaux parte de uma fotografia para pesquisar quem era um dos personagens – que é ela, mas que ela própria não se reconhece na menina. A fotografia é um gênero artístico que também carrega em si as questões da verdade para a realidade”, diz a professora.

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