Experiência de quase morte influencia escrita de “Uma História Enfadonha”, de Tchekhov

9 de maio de 2023

“Tchekhov viu a morte de perto”. Com essas palavras, a professora de literatura russa da USP, Elena Vassina, argumentou por que o escritor, mesmo aos 29 anos, conseguiu ser tão verossímil ao escrever a história de um velho à beira da morte no conto “Uma História Enfadonha”, que integra o livro “O Beijo e Outras Histórias”. O texto foi tema de debate, em 25/4, do Clube de Leitura Amigos da Prosa e Poesia da Apamagis. A mediação foi da magistrada Danielle Cardoso.

Segundo a palestrante convidada, o russo Anton Tchekhov (1860-1904), que também era médico, diagnosticou a própria tuberculose em 1884, quando pela primeira vez teve sangramento do pulmão. Em 1888, o sangramento se repetiu. “Tuberculose, à época, era doença terminal”, disse a professora no encontro.

“Nesse período, ele escreveu a novela. Tchekhov começou a entender que sua vida seria curta e achava que morreria aos 36 ou 37 anos, mas viveu até os 44”, contou Elena Vassina.

Tédio

O protagonista de “Uma História Enfadonha” é Nikolai, um famoso e respeitado professor de anatomia patológica do curso de medicina em Moscou, que agora vive insone e doente, mergulhado em uma rotina entediante ao lado da mulher e da filha. É ele quem narra a própria história.

Elena Vassina disse que “Uma História Entediante” seria um título mais preciso do que o escolhido na nossa tradução, “Uma História Enfadonha”. Isso porque “tédio”, no idioma russo, tem vários sinônimos e muitas nuances de significado. “Esse tédio do personagem tem uma conotação existencial. Não é um tédio porque hoje não tem balada, mas é existencial e está muito ligado à sensação de solidão”, explicou.

Tchekhov sofreu várias influências durante a criação deste conto. Além de viver a época de efervescência do positivismo e do darwinismo, o autor também bebeu na fonte do estoicismo, em especial do livro “Meditações”, de Marco Aurélio, imperador romano que se viu cercado pela ameaça de morte trazida pela Peste Antonina, que varreu o império.

O tempo

Três anos antes da publicação de “Uma História Enfadonha”, outro expoente da literatura russa, Liev Tolstói (1828-1910), de quem Tchekhov era amigo e admirador, havia publicado “A Morte de Ivan Ilitch”.

“Certamente ‘Uma História Enfadonha’ dialoga com esse livro de Tolstói. Seria bom ler e comparar as duas obras”, sugeriu a convidada. Tolstói dividiu “A Morte de Ivan Iilicht” em 12 capítulos e, quanto mais perto da morte do personagem, mais curtos vão ficando esses capítulos. Tchekhov também foi reduzindo o tamanho dos capítulos à medida que a história avança e a percepção de tempo também muda.

Se no começo do conto o protagonista narrador fala de fatos de maneira mais espaçada no tempo, conforme o conto avança, tudo parece acontecer mais rápido, num piscar de olhos. O tempo é, como assinalou Vassina, o grande personagem de “Uma História Enfadonha”.

Essa obra de Tchekhov é cheia de subtextos, costurados por sinais apontados pelo tempo, pela natureza, pela música, pelos animais e outros elementos presentes na narrativa. “Uma História Enfadonha” foi publicado em 1890, em uma coletânea de contos chamada “Gente Carrancuda”

Tchekhov foi um mestre na criação de textos curtos e potentes, e sua escrita, mais ágil que a dos pares do século 19, abria portas para a modernidade. Vencedor do mais importante prêmio da Rússia, o Puchkin, viria a influenciar grandes nomes da literatura, como Clarice Lispector e Ernest Hemingway.

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