Juíza Careen Fernandes revela, em live da Apamagis, os desafios profissionais de quem atua no Amazonas

10 de dezembro de 2021

Se por um lado, em algumas regiões do Brasil, principalmente depois da pandemia, se discute muito a implantação permanente de atendimentos e audiências online, por outro, em algumas localidades a prestação jurisdicional ainda encontra dificuldades, inclusive no modo presencial. Um bom exemplo de um outro país dentro do Brasil é o caso da região Norte, mais precisamente no maior Estado em território da federação, o Amazonas,

Essa questão pautou a live da série “Desafios Profissionais” desta quinta-feira (9/11), transmitida pela página da Apamagis no instagram e conduzida pela diretora de Imprensa da Associação, a juíza e jornalista Carolina Nabarro. A convidada foi a juíza do Tribunal de Justiça do Amazonas, titular da Vara Criminal de Manaus, Careen Aguiar Fernandes.

Carolina Nabarro iniciou a conversa comentando o fato de que para os magistrados de São Paulo, por exemplo, é muito positivo ouvir histórias de quem presta o mesmo serviço em locais tão distintos. “Hoje é dia de ouvir um pouco dessas histórias, vermos se nossas realidades são diferentes. E para quem não é juíz ver também como o nosso trabalho varia muito dependendo da região.”

Careen Aguiar Fernandes falou sobre como é desafiador o trabalho de uma mulher juíza num Estado com distâncias territoriais tão grandes, principalmente por conta da falta de estrutura. “O Amazonas é muito grande com poucas estradas. Muitos municípios distantes têm acesso apenas via fluvial ou aérea. Acabamos vivendo muitas situações curiosas, que são normais para nós que vivemos aqui, mas bem diferente para as pessoas de fora.”

A magistrada contou que ser juíza não estava nos seus planos, mas sim de seu pai, que não havia conseguido realizar esse sonho e o transferiu para a filha. “Gostei muito de advogar, montei escritório. Foi uma experiência muito legal por três anos. Nesse período, apareceu uma oportunidade de ajudar um desembargador do TJAM. Aí comecei a trabalhar com ele, pegava os processos, preparava as minutas. Com o passar do tempo, ele perguntou se eu queria assessorá-lo no TJAM. Aceitei e isso mudou minha cabeça. Saí do escritório, fui estudar, participei de um concurso e fui aprovada, realizando o sonho do meu pai.”

Assim que passou no concurso, Careen Aguiar foi designada para trabalhar longe de sua cidade, Manaus. “Me mandaram para a Comarca de Coari, uma cidade com muitos problemas, localizada na rota do tráfico de drogas que vem da Colômbia e marcada por muita criminalidade. Coari foi a Comarca que fiquei mais tempo e me tornei juíza”, afirmou.

As dificuldades de estar em uma cidade do Interior do Amazonas foram muitas. Até há pouco tempo, questões referentes a documentos, agências bancárias e problemas médicos a obrigavam a retornar a Manaus. “Coari fica pouco mais de 350 quilômetros de Manaus. Não tem estrada para lá. E nem sempre tem voo ou aeroporto. Para Coari, o mais normal é ir nos barcos de linha, grandes, tipo um navio, com mais de 24 horas de viagem. Têm também barcos a jato, mais rápidos, coisa de 10 horas. Tudo com horário marcado, mas não todos os dias..”

A magistrada comentou também que tinha muito medo no começo, já que o único meio de transporte era um barco em que todo mundo ia junto: “Fica todo mundo junto, e não tem para onde fugir. Muitas vezes encontrei réus, vítimas, testemunhas, pessoas do júri. Era praticamente impossível não cruzar com pessoas envolvidas nos processos”.

Segundo a magistrada, “era corriqueiro” nos barcos alguém abordá-la. E, muitas vezes ela nem lembrava da pessoa. “Já teve réu que veio me falar se eu sabia que o tinha condenado. Mas nunca nada intimidador”, disse a juíza.

Além da área criminal, Careen Aguiar lembrou de algumas histórias que viveu nas diversas vezes que foi convocada como juíza eleitoral. Mais uma vez o inconveniente envolveu a viagem de barco. “Uma vez fazendo eleição em Santo Antônio do Sá a mãe da promotora que trabalhava comigo faleceu. E ela ficou desesperada querendo voltar para Manaus. Nós conseguimos uma lancha, abastecemos e no meio do caminho a lancha pifou no meio do rio, naquela imensidão. Só tínhamos água e bolacha. Não havia banheiro. Ficamos mais de 10 horas parados, com uma quantidade absurda de mosquitos. Conseguimos pegar carona com uma balsa que passou ali, transportando gás.”

Ainda sobre a atuação como juíza eleitoral, a magistrada destacou que hoje em dia a situação melhorou muito no Estado do Amazonas. Antigamente, haviam muitos problemas com o envio e apuração dos votos das urnas levadas a cidades mais isoladas. “Devido a dificuldades de acesso, se a gente mandasse uma urna para uma zona eleitoral muito distante, só conseguiríamos apurar os votos 15 dias depois. Por isso, hoje em dia, a urna vai de helicóptero montado por nós. E, no encerramento, a transmissão é feita por meio de uma antena.”

Por fim, Careen Aguiar também ressaltou que, mesmo diante das dificuldades, a Justiça dos Amazonas sempre teve como missão atenuar os problemas causados pelas distâncias, deslocamentos e falta de estrutura. “Temos uma demanda muito maior do que a nossa condição de atender. Perfeito não está, mas o empenho do Judiciário sempre foi no sentido de prover o necessário para essa operacionalização. Hoje temos fóruns na maior parte das cidades”, concluiu.

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