Fiódor Dostoiévski expõe contraste de valores no romance “O Idiota”, de 688 páginas, dividido em quatro partes   

20 de julho de 2023

A apresentação dos personagens principais no primeiro capítulo de “O Idiota”, de Fiódor Dostoiévski, já é prenúncio de uma grande história. Esse trecho do livro foi discutido no Clube de Leitura da Apamagis de julho, que contou com a professora de literatura russa da USP Elena Vassina e mediação da juíza Danielle Martins Cardoso. A conversa sobre outros capítulos da obra do autor russo continuará no próximo encontro, marcado para 8/8 (terça-feira), às 19h, para o qual as inscrições estão abertas.

Logo na primeira página, Doistoévski apresenta os dois personagens principais dentro de um vagão da terceira classe de um trem de ferro da linha:

“Em um dos vagões de terceira classe, ao pé da janela, desde o alvorecer viram-se frente a frente dois passageiros—ambos jovens, ambos quase sem bagagem, ambos vestidos sem elegância, ambos de semblantes bastante formosos e ambos com vontade de finalmente começar a conversar. Se ambos soubessem um sobre o outro o que os fazia dignos de nota particularmente nesse instante, iriam, é claro, surpreender-se com o fato de que o acaso os havia colocado frente a frente e de modo tão estranho em um vagão de terceira classe do trem da rota Petersburgo-Varsóvia”.

“Note quantas vezes ele repete ‘ambos’. Essa é uma inter-relação que Dostoiévksi estabelece entre os personagens”, afirma Elena Vassina. Ambos são jovens na casa dos 26, 27 anos. Parfen Rogójin tem olhos castanhos e cabelos escuros; o príncipe Liev Nikoláievitch Míchkin é loiro, de olhos azuis. “Parecem como fotografia positivo e negativo”, diz a palestrante. Michkin representa o espiritual; Rogójin, o carnal.

“É muito típico, é a polaridade no mundo de Dostoiévksi. Eu sempre digo que ele não pinta com aquarela, pastel: ele tem preto e vermelho, branco e preto. A gente vai ver que todo o romance vai ser composto desses contrastes”, explica Elena Vassina.

Michkin fará sua primeira parada na casa do general Iepántchin e da mulher dele, que tem algum grau de parentesco com o príncipe. Lá, verá uma foto de Nastácia Filíppovna, sobre a qual Rogójin já havia falado no trem, demonstrando estar apaixonado. Michkin fica impressionado com sua beleza, mas vê tristeza no semblante da jovem.

As histórias dos personagens irão se cruzar e, segundo Elena Vassina, Dostoiévski colocará todos juntos em determinadas passagens, o que também é comum em sua produção literária.

Trabalhos forçados

“O Idiota”, assim como em várias outras obras do autor, tem trechos que remetem à própria biografia de Dostoiévski. Neste, por exemplo, Michkin conversa com o general sobre uma execução em praça pública. Também diz, outra hora, que é bom em caligrafia.

As situações são uma alusão à prisão política de Dostoiévksi quando ele tinha 27 anos – não por acaso a mesma faixa etária de Michkin e Rogójin. Ele foi condenado à morte em praça pública por fazer parte do Círculo de Pietrachevski, grupo que defendia o socialismo utópico e se opunha ao czarismo.

Quando a sentença estava prestes a ser cumprida, diante do povo, um emissário do czar anunciou a decisão do monarca de comutar a pena a trabalhos forçados na Sibéria. Lá, Dostoiévski trabalhou na produção de tijolos e depois passou a ser escrivão, atividade que o levou a aprimorar sua escrita.

Saia penhorada

Elena Vassina também contou algumas curiosidades relacionadas ao livro. Uma delas é que logo após casar-se pela segunda vez, Dostoiévski teve de sair às pressas de São Petersburgo porque devia dinheiro para muita gente. Fugiu com a esposa para a Suíça, levando consigo uma quantia emprestada pelo seu editor. O pagamento seria feito com a nova obra, “O Idiota”.

Só que Dostoiévski não pagou a dívida tão rápido. Na Europa, ficou viciado em jogos, perdendo o pouco que tinha em cassinos. Sua mulher engravidou e, para se sustentarem, Dostoiévksi chegou a penhorar a única saia de frio que ela tinha. O dono do imóvel onde moravam parou de dar velas para o escritor, que gostava de escrever à noite, embalado por fumo a chá forte.

“O Idiota” foi publicado na revista “O Mensageiro Russo”, como folhetim. Por isso, há trechos em que o autor guarda um suspense para o capítulo que virá. A obra tem 688 páginas distribuídas em quatro partes

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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